Solange Almeida - Em voos sempre altos

Plantão Ceará | 11:04:00 | 0 comentários


Foram mais de dois meses de tentativa. Um assessor passando para outro, muita troca de e-mails e datas mudadas em cima da hora. Foi só depois de muita insistência que ouvimos o sim de Solange Almeida. Mas se engana quem achar que todo esse percurso é sinal de estrelismo. A cantora e compositora do Aviões do Forró é de uma naturalidade ímpar, mesmo para se orgulhar sem pudor das conquistas que a fama e o dinheiro lhe trouxeram.
Solange vive numa bela casa de condomínio fechado no Eusébio. Foi lá que ela recebeu a equipe do O POVO para uma longa conversa sobre os altos e baixos da vida e da carreira. Com muitos risos e nenhuma lágrima, Solange tem a firmeza de quem precisou de muita coragem para vencer na vida. É essa a história que ela conta, com os pés descalços e pedindo, aqui e acolá, um copo de suco (maracujá) ou uma xícara de café. Segundo Solange, essa é a primeira vez que ela fala tanto sobre a própria vida. E vale saber o que ela tem a dizer.

O POVO - Para começar, queria saber um pouco da sua vida...
SOLANGE ALMEIDA - Eu sou de Alagoinhas, na Bahia. Nasci dia 29 de agosto de 1974, de parto normal. Eu gosto de falar que é parto normal, porque hoje as coisas estão tão diferentes que as mulheres preferem o parto cesárea. Os meus filhos foram parto normal. Com dois não foi possível, mas não foi por escolha. Foi por necessidade. Quando engravidei da Estrela, eu estava bem gordinha. E a Maria Esther nasceu prematura.

OP – A vontade de ser cantora veio cedo?
SOLANGE – Comecei a cantar muito pequena. Me lembro de coisas, como eu na frente de uma TV, ainda em preto e branco, vendo a Clara Nunes cantar. E eu ficava imitando. Aos 4 anos, meu tio Vital tinha um violão e começou a levar para a minha casa e a gente cantava juntos. Foi aí que a coisa despertou. Na escola, as minhas coleguinhas cantavam música de criança e eu já cantava Roberto Carlos, Clara Nunes, Guilherme Arantes. E eu era totalmente diferente das minhas amigas, eu já sabia o que queria ser. Eu queria ser cantora. Aos 9, eu comecei a participar de shows de calouros, nos showmícios. E foi nessa época que eu fiz a minha primeira apresentação na TV, que foi com a Mara Maravilha. Ela tinha um programa local, em Salvador. Eu tinha 8 ou 9 anos e ela tinha 16. Me apresentei no programa dela, pela primeira vez, cantando em inglês.

OP – E lembra qual era a música?
SOLANGE – Lembro sim. Era Onmyown, da Nikka Costa. Eu adorava essa coisa de ser internacional. E o engraçado é que até hoje eu não falo nada de inglês, mas eu era criança, né? Foi horrível. Eu lembro que para aprender a cantar, eu escrevia do jeito que ouvia. E tirei o primeiro lugar nesse concurso. Aí pronto. Depois disso, eu sabia o que queria.

OP – E a sua família sempre de te apoiou?
SOLANGE – Sempre. A minha família toda. Na época, a gente tinha condições financeiras. Eu era de classe média alta. Meu pai, Paulo Leôncio, trabalhava na Petrobrás e sempre me apoiou em tudo. E a minha mãe, Joanita Almeida, adorava a arrumar a boneca dela. Cada show era uma roupa e um sapato diferente. Para você ter uma ideia, quando eu tinha 12 anos, a minha mãe pintou o meu cabelo de louro. Ela dizia que eu tinha que ser loura. Até lente de contato eu usava. E era ela quem me acompanhava (nas apresentações). Mas tanto ela quanto meu pai tinham uma confiança muito grande em mim. Eles fizeram uma procuração me autorizando a viajar sozinha para qualquer lugar.

OP – Então, não deu nem tempo de pensar em outra opção de carreira?
SOLANGE – Não, sempre foia música. Mas eu cheguei a prestar vestibular e ser aprovada no curso de Farmácia, na Universidade Estadual da Bahia. E passei pra Odontologia na Federal. Tentei cursar, mas não era pra mim. Aí passei a cantar em barzinho e em praças de alimentação de shopping. Não tinha jeito, era a música que eu queria. Pra vocês terem uma noção, a minha primeira banda foi aos 12 anos. Chamava Sabor de Maçã, era uma banda que eu formei com uns meninos de Barrocas, um distrito do interior da Bahia. E eu lembro que os (músicos) que ganharam destaque foram eu e o baterista, que acabou depois indo tocar com Durval Lelys (guitarrista e vocalista da banda Asa de Águia). E foi nessa época, que eu passei a cantar tudo. Era uma banda de baile e eu me permitia tudo. Do forró de Elba Ramalho até sucessos internacionais. Isso entre 1986 e 1990. Antes mesmo da axémusic, só tinha o Chiclete com Banana e ainda não era com o Bell Marques. O vocalista da época era Missinho.

OP – Fala mais dessas outras bandas que você participou. 
SOLANGE – Depois da Sabor de Maçã, que eu fiquei um pouco mais de um ano, fui chamada para a maior banda da minha cidade: Magnifico. Era uma banda de baile super estourada. Eu era fã da cantora. Ela fazia uns agudos fora do normal e era uma coisa que eu não fazia na época. E ela esnobava, era bem metida. Aí ela engravidou e foi a minha chance. Eu só tinha 13 anos de idade e acabei substituindo ela. Fiquei nessa banda até os 14 anos e fui chamada para outra banda, não tão badalada quanto a Magnifico. O empresário era conhecido por dar calote em todo mundo, mas foi um amigão pra mim. Foi uma das primeiras pessoas a me dizer que eu cantava muito e que ainda ia longe. Ferrerinha, o nome dele. Ele me deu essa oportunidade e eu fiquei até os 15 anos nessa banda, foi quando eu arrumei meu primeiro namorado.

OP – E como foi isso?
SOLANGE – Sabe aquele primeiro amor? Que você descobre tudo com ele? Pois é, Flávio o nome dele. Só que a família dele não aceitava o nosso romance. Eles me julgavam por cantar. Segundo meu namorado, toda cantora era puta. Ele disse que a mãe dele não queria e, em nome desse amor, eu resolvi parar de cantar. Fiquei muito frustrada e não era feliz. Uns dois anos depois, eu resolvi voltar a cantar. Consegui convencer a todos que eu não era nada daquilo que eles achavam se até minha virgindade eu perdi com ele.

OP – Foi fácil esse retorno?
SOLANGE – Fui convidada para participar de uma banda de teclados, Luís Cláudio & Companhia, e foi a minha primeira desilusão com a música. Quando eu cheguei, já havia outra menina e ela não me aceitava. Porque eu sempre chamei muita atenção. Era magra, alta, cabelão loiro e ela era toda pequenininha. Só que ela cantava um estilo totalmente diferente do meu e eu tratei logo de deixar bem claro que eu não tava ali pra tirar o lugar dela, tava pra somar. Aí com o tempo, ficamos amigas. Ainda lembro a primeira música que cantei nessa banda, era o tema da abertura da novela Vamp (Noite Preta, de Vange Leonel). A desilusão aconteceu quando a banda foi convidada para gravar uma coletânea de novos talentos da Bahia, era um LP. E eu nunca tinha gravado nada e jurava que seria chamada para gravar alguma coisa. Só que, sem querer, eu ouvi uma conversa do dono da banda dizendo que eu não ira gravar. Ele disse que eu desafinava muito e não tinha condições de gravar. Para mim, aquilo foi mesmo que a morte. Fiquei arrasada, chorei muito. Mas levei aquilo como uma crítica construtiva. O que me machucou foi porque ele não falou pra mim.

OP – E você ainda namorava nessa época?
SOLANGE – Em 1992, eu acabei meu namoro. Eu amei esse homem até um dia desses, acredita? Quando ele acabou comigo, em 25 de março de 1992, foi uma dor do outro mundo. E nesse mesmo ano, a minha mãe faleceu. Eu já estava com 18 anos. Só que a minha mãe realizou um sonho antes de morrer, que era conhecer Fortaleza. Meu pai resolveu que eu e ela iríamos fazer essa viagem. Na época, o polo de roupas daqui já era muito famoso. Então, a gente veio em uma excursão. Quando a gente chegou aqui, eu já arrumei um namoradinho. Não lembro o nome dele, só lembro que o pai dele tinha um box no mercado central. E nessa viagem, eu me lembro muito bem de estar caminhando com a minha mãe na Beira Mar, em frente ao hotel Esplanada, e olhei e disse pra ela: “Mainha, eu ainda venho morar aqui em Fortaleza. E tudo o que eu sonho, vou conseguir aqui. E vou ser muito famosa”. Nesse mesmo dia a minha mãe teve a primeira crise do aneurisma. Ela sentiu uma dor muito forte e nós antecipamos a volta. E seis dias depois ela faleceu. Isso foi em novembro de 1992. Foi na mesma época que eu comecei a engordar. Depois que ela faleceu, eu resolvi ir embora. Não tinha nada me prendendo em Alagoinhas, eu não estava em nenhuma banda e só cantava em barzinho. Meus pais já estavam separados. E fui correr atrás do meu sonho. Fui embora para Sergipe com um namoradinho que tinha na época. Ele morava em Aracaju, só que a família dele era da Paraíba. Em Sergipe, fui convidada para tocar em uma banda de baile que os donos eram cegos. E foi uma escola para mim, foi quando eu fiquei conhecida. Como o grupo tocava em muitas cidades como Campina Grande, Aracaju, Paraíba e até em alguns interiores aqui do Ceará, eu comecei a ganhar nome.

OP – E o que aconteceu daí em diante? A carreira ganhou um novo impulso?
SOLANGE – Depois, eu fui convidada para uma das maiores bandas de Natal. Era o Grupo Show Terríveis, uma banda de baile que foi a minha faculdade musical. Isso em 1995. Foi lá que eu conheci o Dorgival Dantas. E eu fiquei ainda mais conhecida. E cantava tudo, me sentia o máximo. Nesse mesmo ano, eu adotei a Sabrina, minha primeira filha. Eu a adoteiainda na barriga da mãe. Eu tinha o sonho de me tornar mãe e era eu que cuidava, fazia tudo. Em 1996, eu já estava em um relacionamento sério e engravidei. E meu filho nasceu e morreu. Foi a pior dor da minha vida. Para eu superar, foi uma força sem tamanho. Sabe o que é ter o peito cheio de leite e não ter o filho para mamar? Foi uma barra muito pesada.

OP – E quando veio outra gravidez?
SOLANGE – Três anos depois, eu engravidei do Rafael, que é meu único filho homem. Quando eu engravidei do Rafa, eu descobri que tinha um problema muito sério no útero. Foi uma gravidez de alto risco. Eu perdi o emprego e passava necessidade mesmo. Eu morava com o pai do Rafa, a gente tinha uma casa e dividíamos algumas coisas. Só que ele não tava nem aí para nada. Eu apanhei muito dele. Eu tinha um Fusca e tive que vender para comprar o enxoval do Rafa. Dia 2 de outubro de 1999, o Rafael nasceu de parto normal, só que ele já nasceu com uma parada respiratória. E eu lembro que eu chorava e pedia para a minha mãe não deixar levarem o meu filho. Quando disseram que ele tinha que ir para UTI, eu ouvi uma voz dizendo para colocar ele no meu peito. Tem gente que não acredita nisso, mas foi o que aconteceu. Quando eu o coloquei no colo, ele procurou o peito. Ele mamou por quase duas horas. Todos os médicos ficaram dizendo que era um milagre. Até hoje me emociono muito com essa história. Eu ainda vivi com o pai dele durante alguns anos. Depois do filho, ele começou a me tratar melhor, mesmo me traindo. Só que era chumbo trocado. Era ele de lá e eu de cá. 

OP – E como ficou o trabalho nessa época?
SOLANGE – Depois disso, em 2000, eu fui convidada para a Banda G, lá de Pernambuco. E foi lá que eu gravei a minha primeira música de forró e fiquei conhecida como cantora do ritmo. E essa banda fez muito sucesso com uma música chamada Volte a sorrir, que era uma versão de uma canção da Whitney Houston. E eu, bem ousada, me metia e fazia um agudo igual o da Whitney. Foi um sucesso não só Nordeste, mas em São Paulo também. A música estourou no Ceará, foi quando eu vim morar aqui. Foi uma decisão muito difícil porque eu tive que deixar meus filhos. O Rafa só tinha dois meses de vida e ficou com a babá. Eu vim para morar na Caucaia e fazer shows pela região. Fiquei muito conhecida como cantora de forró, foi quando eu conheci o Isaías (CDs, empresário). Eu fiquei nessa banda até 2001, quando a minha sogra adoeceu de câncer e eu quis cuidar dela. Larguei tudo de novo e voltei para Natal, para a mesma banda que eu cantava antes de engravidar do Rafael. Infelizmente, pouco tempo depois, a minha sogra faleceu.

OP – Foi nessa época que você recebeu um convite pra cantar na Caviar com Rapadura, não?
SOLANGE – Fui convidada para gravar um disco com eles e a música que eu gravei foi um sucesso. Aí, recebi o convite para ficar na banda. Só que o problema é que a banda tinha muitos vocalistas, era uns cinco ou seis. Foi quando comecei a sofrer diretamente com o preconceito. Quando chegava a minha hora de cantar, eu sempre ouvia: “Não, não bote ela não porque ela é gorda”. Foi muito difícil, eu tava muito gorda, sem um pingo de autoestima, com filho pequeno e sendo muito humilhada.

OP – Que tipo de humilhação você sofria?
SOLANGE – Eu ouvi coisas horríveis. Era chamada de baleia. Teve um episódio que eu nunca esqueci. O Caviar com Rapadura foi convidado para tocar no programa do Raul Gil e a música que estava ‘estourada’ na época era uma música minha. Quando chegou na hora de entrar, o dono da banda disse que eu iria ficar atrás do palco e a Mara, a outra vocalista, iria me dublar. Eu virei um bicho. Disse que de maneira alguma outra pessoa ia cantar a minha música. Fiz um escândalo. Então a banda resolveu cantar outra música. Era muito escroto. Eu tenho a voz que estoura a música e eu não posso cantar a música? E eu decidi parar de cantar. Estava cansada de tantas humilhações e das dificuldades. Outra decepção foi quando ainda morava em Natal, ainda na década de 1990. Eu fui convidada por uma cara para gravar um CD de uma banda que ainda não existia. Se o CD vendesse, ele iria formar a banda. Era o Cavalheiros do Forró. O CD foi um sucesso, só que o cara não me chamou pra ficar na banda porque eu era gorda. Mas enfim, olha aonde a gorda chegou (risos).

OP – E o que aconteceu com seu trabalho no Caviar com Rapadura?
SOLANGE – Eu pedi desligamento da Caviar com Rapadura e decidi não fazer mais parte de banda. Passei a trabalhar só em estúdio, gravando jingles e essas coisas. Isso, eu já estava morando no interior do Maranhão. Foi quando o Isaías me ligou e me convidou para fazer parte de um projeto chamado Aviões do Forró. E eu fiquei surpresa com a ligação, realmente não esperava. Eu disse exatamente assim: “Moço, o senhor me conhece? Já me viu pessoalmente?” E ele respondeu dizendo que sabia que eu era gorda, só que eu tinha “a voz”, uma coisa que poucas tinham e era isso que ele tava procurando. “Não estou interessado na sua beleza”.

OP – E aí nasce o Aviões.
SOLANGE – Bom, eu não tinha dinheiro pra voltar para o Ceará e acabei pegando uma carona com a banda Canários do Reino. Cheguei aqui sem um centavo, lisa mesmo. Quando eu cheguei, o Isaías me disse que eu iria ficar em uma apartamento que ele tinha lá na serrinha, que eu iria dividir com o outro cantor. E foi no dia que eu conheci o Xande. Eu o conheci no restaurante Tia Júlia, ele tava comendo um PF (prato feito), sentando naquelas mesas de plástico. Ele já conhecia o meu trabalho, porque ele é do Rio Grande do Norte e eu já tinha feito sucesso por lá. E a gente ficou morando no mesmo apartamento durante um tempo. E nasceu uma amizade muito forte dali. A gente dividia tudo. No começo era muito difícil, ganhávamos muito pouco e tinha vezes que até pagávamos para tocar. Moramos juntos por quase um ano, até eu trazer os meus filhos de Natal. Eu ainda era casada com pai do Rafa, estávamos jutos há quase oito anos. Só que o nosso relacionamento não deu certo com a distância, porque eu fiquei morando aqui em Fortaleza e ele em Natal. Em dezembro de 2002, meus filhos vieram morar definitivamente comigo e o Xande também trouxe a família dele. A gente passou um mês divulgando a banda até o Aviões do Forró fazer o primeiro show no dia 19 de outubro de 2002, no Cantinho do Céu.

OP – O Isaías já afirmou que o Aviões foi pensado para ser um diferencial no mercado. Como foi que ele te explicou o que era o Aviões do Forró?
Solange – Ele disse que queria algo novo. Para começar pelo número de vocalistas, o Aviões foi um dos primeiros grupos a trazer só duas vozes para o palco. Mas quando começou, éramos três. Eu, Xande e o Felipão (do forró Moral). Mas, como a banda tinha poucos recursos, optaram por ficar só comigo e o Xande. Mesmo o Zequinha Aristides, que era o dono do Caviar e um dos sócios do Aviões, que tinha um pouco mais de condições, preferiu fazer assim. Outro ponto que eles queriam fazer diferente era com a batida da música. O Aviões teria uma identidade. E esse formato dura até hoje.

OP – E como ficaram aqueles outros problemas nessa nova banda? 
SOLANGE – Foi muito difícil, porque eu era gorda e sem vaidade. E isso importa nesse meio. Se a banda decolasse, iria explodir. E o engraçado, é que muitas pessoas que fizeram chacota com a gente, hoje, sobrevivem da gente.

OP – Você já afirmou em entrevista que tentou suicídio. Foi nessa época?
SOLANGE – Não, isso já foi depois. Foi depois da gravidez de Estrela, minha segunda filha.Foi dois anos depois de lançar o Aviões. Eu me envolvi com um segurança da banda e fomos morar juntos e foi quando eu engravidei. Foi outra gravidez de risco e eu tive que me afastar da banda por dois meses. A minha relação também era muito conturbada. Eu sofria muito. O mercado é muito machista. E além de mulher, eu era muito gorda. Os sócios da banda também eram muito machistas, o destaque maior sempre era para o cantor. Eu passava de horas sentada para poder cantar uma música. E isso era terrível para mim. A questão financeira também: os cantores tinham privilégios, a cantora não. Tanto que o Xande passou a ser sócio (da banda) antes de mim. Eu só consegui depois de muita briga. Mas é uma das coisas que mais me orgulho, é que tudo que eu consegui foi por mérito. Nunca precisei ficar com ninguém para chegar onde cheguei. Eu já tinha conquistado algumas coisas, como uma casa e um carro. Mas eu não era feliz. Vivia um conflito comigo. E foi quando eu tentei o suicídio. Tentei me jogar na frente de um carro. Foi uma época punk. Mas, graças a Deus, foi superado. Faz 10 anos, eu tinha uns 34 anos.

OP – E como foi que você resolveu fazer a cirurgia bariátrica? Como ela mudou a sua vida?
SOLANGE – Ela mudou tudo. Foi positivo para todos os aspectos, inclusive para o Aviões do Forró. Mesmo com uma vocalista gordinha, a banda já tinha um destaque nacional. Já tínhamos ido ao programa da Hebe, do Faustão, gravado com a Ivete. A gente venceu por mérito. Mas a cirurgia veio mesmo por questões de saúde. Eu sempre fui muito cricri, sentia qualquer dorzinha, ia ao médico. E foi assim que eu descobri que estava com gordura acumulada no fígado. Eu já tinha tentado emagrecer de todo jeito. Muita gente fala que emagrecer com cirurgia é fácil. Só que não é. Só sabe quem passou. É uma luta diária, até hoje. E todos me apoiaram. Porém, Xande até hoje diz que prefere a Sol gordinha (risos). Eu era muito tímida, antipática. Porque eu via as pessoas fazendo chacota de mim. “Canta pra caralho, mas é gorda”, eu ouvi muito isso. Então, eu acho que foi uma decisão acertada. Depois de toda uma preparação com psicólogo, eu fiz a cirurgia.

OP – Há quem diga que você perdeu a voz por causa dessa cirurgia. Isso aconteceu?
SOLANGE – Eu ouvi muito isso. O que aconteceu é que eu eduquei a minha voz. Aprendi a usar a minha voz. Eu era muito histérica. Só que eu escuto isso até hoje. Mas isso (a mudança na voz) veio com a experiência.

OP – Existe uma crítica muito grande em cima das letras de forró por conta do conteúdo machista. Porém, um dos sucessos do Aviões é Titular e Absoluta que é uma música onde a mulher se coloca de uma outra maneira. Qual sua opinião sobre isso? Você acha importante ser uma porta-voz do empoderamento feminino nesse meio?
SOLANGE – Titular e Absoluta é minha. Eu acho sim, muito importante. As minhas músicas são todas de histórias que já vivi, e com essa letra não foi diferente. A música foi um sucesso. E, de lá pra cá, as mulheres deram um boom. E tiveram outras, como BláBlá. É claro que o machismo é muito forte. Só que eu acho que a mulher também se vitimiza demais. Ela só que ser igual ao homem em algumas situações, em outras ela quer privilégios. E eu acho que não é pra ser assim. Me sinto orgulhosa de ter dado esse up para a mulher. Para as mulheres gordinhas, para cantar, para estourar uma banda de forró. Eu acho que abri portas nesse sentindo. Eu me sinto do caralho. 

OP – O que é ser uma mulher à frente de uma grande banda de forró? 
SOLANGE – Estar em uma banda como o Aviões do Forró é do caramba. O Aviões se tornou referência. Antes, nos primórdios, as pessoas viam o forró com muita miséria. Era uma coisa triste, que só falava de seca, de pobreza, de fome, de muita coisa negativa. E o Aviões mostrou um outro lado da coisa. Aviões é uma banda que pega no pé e no coração. Temos uma batida dançante. Sim, às vezes tem letras de duplo sentindo. Mas isso o mercado pede. As pessoas gostam dessas músicas de paredão, de balada. No meu ponto de vista, (essas músicas) não têm muito a acrescentar, não faço questão de tocar esse tipo de música. Porém, o povo consome. Mas a gente fala muito de amor. E mudamos também nesse sentindo, ter uma mulher de frente. Eu tenho muito orgulho de ser essa mudança. Embora, não goste desse título de “melhor cantora de forró do Brasil”. Primeiro, eu não sou cantora de forró. Eu canto de tudo. Isso me incomoda, ter um segmento. Acho preconceituoso e limitador. Eu não me vejo limitada. Sou muito mais que uma cantora de forró. Outra mudança que a gente trouxe foi o Aviões Fashion. As pessoas eram acostumadas com as cantoras sempre bregas, muito nuas e muito expostas. Eu quis mudar isso. De estar sempre bem vestida, produzida e por dentro da moda. Passei a me infiltrar nesse mundo. Houve uma reciclagem. O Xande, hoje, é bem sofisticado. Bem mais do que eu. Eu sou da bagaceira. O Aviões mudou muito o cenário local. Ainda somos muito criticados quando resolvemos mudar, como foi com a PoolParty. Mas a gente gosta de mudar, para atingir um leque de pessoas maior. Levamos o forró para uma parte do Brasil que não ouvia. 

OP – Recentemente, você posou nua. Como foi a experiência? 
SOLANGE – Eu sempre gostei de andar nua. Minha mãe dizia que era para eu ter nascido índia. E eu tenho um fotógrafo, que era fã e virou amigo, que ele ia fazer uma exposição, em Mossoró, e disse que queria um clique meu nua. Eu achei o máximo. Então, ele me enviou uma foto da Demi Moore, na época que ela fez o filme Striptease. Eu adorei a ideia, mas o tempo passou e isso ficou pra trás. Um dia, eu estava aqui em casa com o Morzat, que é quem me maquia, e ele resolveu cortar meu cabelo. Assim que ele terminou, meu amigo (fotógrafo) me liga e fizemos a foto no mesmo dia. Fomos para Mossoró e quando cheguei lá, eu já me soltei. Sou muito descarada. E fiz a foto. Considero uma das fotos mais lindas que eu já fiz. Mas foto nua só daquele jeito mesmo. Mostrando tudo, eu não tenho coragem não. 

OP – Já havia essa vontade antes, de pousar nua?
SOLANGE – Não, nunca tinha pensado. Embora ame me clicar nua. Se eu perder o celular, tô frita. Amo meus nudes. 

OP – O fato de você ter feito essa foto, teve algum problema por você ser evangélica?
SOLANGE – Eu não quero me intitular evangélica. Deus não deixou religião. Então, eu não me considero evangélica. Eu creio em Deus, sou cristã. Onde falam de Deus, eu tô junto. E críticas a gente recebe todo dia. Eu pago minhas contas, não devo nada a ninguém. Eu não quero opinião, principalmente de rato de igreja. As pessoas falam que é muito fácil para mim falar do Senhor e não abrir mão das coisas do mundo. Isso aqui é meu trabalho e eu tenho quatro filhos que dependem dele. Fora a minha família, que eu ajudo e uma série de pessoas que precisam de mim. Eu não vou abandonar o meu sustento por causa de meia dúzia de pessoas que acham que podem apontar o defeito dos outros. Deus sabe do meu coração. Meu compromisso é com ele.

OP – Além de cantora, você tem uma linha de lingerie e outros tipos de negócios. Como é a Solange empresária?
SOLANGE – Eu gosto de me envolver nas minhas coisas. Eu adoro moda, é onde eu me destaco nesse meio. Além das lingeries, eu tô com uma linha de t-shirts e bonés que tem dado muito certo. Eu não posso me dedicar a isso o tempo todo, mas eu tenho gente de confiança trabalhando para mim. 

OP – Artista, viajando a maior parte do tempo e com muitos compromissos. Como é que você faz pra cuidar de quatro filhos e uma casa?
SOLANGE – Eles têm idades bem diferentes e necessidades também. Sabrina vai fazer 21, agora em julho. Rafael faz 17 em outubro, Estrela faz 10 em novembro e Maria Esther faz 3 em outubro. Quando eu tô em casa, eu tento estar sempre presente. Mesmo distante, eu me faço presente. Sou daquelas mães que confere a agenda, as notas, de fazer programas juntos. Eu sou muito dona de casa. Gosto de saber tudo o que eles comem, vou ao supermercado, cozinho. Tem dias que eu dou folga para as minhas ajudantes e vou pra cozinha. Eu gosto disso. Eu faço o máximo que posso e eles sempre são a minha prioridade. 

OP – Sendo uma pessoa de origem humilde, qual foi o primeiro luxo que você se deu? 
SOLANGE – Caramba (depois de pensar muito). Eu acho que foi meu carro de luxo. A minha Land Rover. Eu tinha muita vontade de ter um e eu vi que era o carro da rainha da Inglaterra. Aí é que eu quis mesmo (risos). Fui a primeira forrozeira a ter esse carro. E ainda comprei à vista.

OP – E como funciona a cena do forró nacional? Existe um boato de uma rixa entre o Aviões e o Safadão. Isso é mesmo verdade? Como é essa relação entre os artistas? 
SOLANGE - Eu sou muito reservada, não tenho uma vida social muito badalada. Infelizmente, como em qualquer meio, existe muito a coisa da competição. E eu acho que é até saudável porque você sai da zona de conforto. Mas, Wesley esteve na minha casa pela primeira vez quando Estrela nasceu. Nós conversamos e eu disse a ele que ainda tinha muita coisa boa no caminho dele. Dava pra perceber que ele iria longe. Ele é muito bom. Mas ele só chegou onde tá hoje porque persistiu. Lá atrás, eu fiz uma observação para ele. Logo no início, você ouvia Wesley e ouvia Xande e não sabia quem era quem. As vozes eram muito parecidas. E eu disse isso a ele. Para ir longe, você precisa da sua identidade e parar de olhar para A, B ou C. E hoje, as pessoas podem dizer o que quiserem, mas durante muito tempo o Aviões foi sozinho. O cenário mudou. O Aviões não caiu, nós continuamos grandes. O Wesley que cresceu. Nós já éramos conhecidos e agora ele é também. Isso é bom para o forró, é bom ver tantas bandeiras levantadas ao nosso favor. É a nossa música ganhando o mundo, ganhando todas as classes sociais. Hoje forró é moda. E isso me deixa feliz. Eu e Xande nos sentimos muito responsáveis por isso. Não sou amiga de Wesley, mas nos respeitamos. E eu torço muito por ele. 

OP – Uma vez o Chico César, quando era secretário da cultura, proibiu o que ele chamou de ‘forró de plástico’ no carnaval da Paraíba. O que você achou dessa proibição? Essa expressão que ele usou te incomoda?
SOLANGE – Eu sou fã do Chico César, gosto bastante do trabalho dele. Mas me incomodou muito ouvir isso de uma pessoa tão culta. Porém, não mudou nada. Mas eu queria saber o que ele disse sobre forró de plástico. A pessoa que me magoou quando fez esse tipo de comentário foi Dominguinhos. Esse me machucou, porque eu era fã. E ouvir isso de quem você admirava. Ele disse que o Aviões não fazia forró e isso doeu muito. Eu pensei “tudo se moderniza”. Com o forró foi a mesma coisa. Já pensou se não tivesse evoluído? As pessoas têm que respeitar isso. Independente do que seja, seja forró universitário, elétrico, o forró da puta que pariu, as pessoas precisam respeitar. E, sinceramente, foi ridículo para o Chico César. Voltando a falar de Dominguinhos, que nos criticou duramente, um ano depois nos estávamos dividindo o mesmo palco. Ele foi ao nosso camarim, pediu desculpas e nos convidou para cantar no show dele. Infelizmente, nós não poderíamos ir por que tínhamos outro show em seguida. Então, nós o convidamos para ir ao nosso palco e ele foi. Dali surgiu uma amizade e no ano seguinte nos cantamos juntos. Foi quando ele me confessou que estava muito doente e (disse) “eu não sei se no próximo São João eu estarei aqui. Eu quero pedir desculpa pelas minhas colocações e eu quero que vocês dêem continuidade ao que eu e Luiz Gonzaga começamos lá atrás”. E até hoje, isso me emociona muito. A opinião dele era importante. O resto é resto. 

OP – E como é o forró no exterior?
SOLANGE – Eles consomem bastante a nossa música. Mas é o brasileiro que escuta a gente fora. Seria um absurdo afirmar ao contrário. Os shows são bons e temos uma boa imagem, isso é o que importa. 

OP - Você vem preparando um projeto solo agora para o segundo semestre. O que é esse projeto?
SOLANGE – Eu quero que as pessoas vejam uma Sol diferente. E esse trabalho é isso. É um DVD que eu estou preparando, eu tô escolhendo o repertório. Quero me mostrar diferente. Uma Sol que toca violão, que foge dos limites do forró. Esse trabalho vai ter participações especiais, como a Anitta. Eu quero mostrar isso: uma Sol diferente. (A gravação) Vai ser em outubro, em São Paulo. Porque eu sou dessas, não tenho medinhos. Quero me mostrar. Tô bem empolgada. 

OP – Mas isso não significa o fim do Aviões, significa? 
SOLANGE – Não, eu acho que não. Eu acredito que ciclos se encerram sim. Não sei se essa é a hora. A gente se respeita bastante, eu e Xande, e eu acho que na hora vai acontecer. Mas eu não posso ser hipócrita: eu sonho em ser mais dona da minha carreira, ter mais liberdade e fazer mais aquilo que eu gosto. Eu sonho com isso, mas não sei quando vai acontecer. Deus é quem sabe, eu não. 

OP – Como você pensa sua carreira para daqui a alguns anos?
SOLANGE – Eu não consigo me ver fazendo outra coisa que não seja cantar. Já pensei em parar, mas eu não sei fazer outra coisa. Eu não consigo me imaginar fora dos palcos. Me vejo velhinha, em cima de um palco, cantando. Dona do meu nariz, fazendo o que quiser. E claro, ganhar um Grammy, porque eu sou ousada. Eu só paro pelos meus filhos. Para cuidar da carreira deles. Pronto, só pararia por isso.


PERFIL
Solange Almeida Pereira Barbosa é natural de Alagoinhas, na Bahia. Nascida em 29 de agosto de 1974, ela começou a cantar ainda cedo em programas de TV e rádio. Participou de bandas de baile em diversos estados no Nordeste. No entanto, a fama e o reconhecimento vieram como vocalista do Aviões do Forró, função que divide com o parceiro Xande. Depois de 14 anos à frente do grupo, ela se prepara para lançar o primeiro trabalho solo.

PERGUNTA DO LEITOR

Lorena Nunes, cantora e compositora

Lorena - Como você consome música e o que gosta de ouvir??
Solange - Eu faço tudo e escuto de tudo. Eu ouço rádio no carro, tem muita música no celular, compro CDs. E é de tudo, do clássico ao sertanejo. E os meus filhos todo dia me apresentam uma novidade. Um dia desses foi apresentada a Demi Lovato. A Estrela é bem internacional e sabe de tudo. Ela todo dia me mostra uma novidade. O Rafa também é super eclético. Só não gosto mesmo é de metal. O resto, eu curto é tudo.

Fonte: O POVO Online 


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