O padrão Fifa e seu novo modelo de arena de futebol gera debate sobre sua influência na elitização dos estádios

Plantão Ceará | 10:57:00 | 0 comentários

O futebol pentacampeão mundial passa por uma crise de identidade. Ao longo de décadas de profissionalismo claudicante, o País tenta reinventar sua maneira de gerir o esporte e está diante de um fenômeno que intriga especialistas e entusiastas: até que ponto as arenas irão elitizar o futebol brasileiro?

A recente pauta, motivada pela realização da Copa das Confederações e pela iminência da Copa do Mundo, vem gerado muitos e calorosos debates. O tema é o quarto da série "De torcedor a consumidor", que tem estampado as páginas do Diário do Nordeste aos domingos.

A "Pátria de Chuteiras", como eternizou Nelson Rodrigues, tem o futebol como componente fundamental de sua cultura. No Brasil, se vive e respira futebol, mas só agora ele é verdadeiramente consumido.

Coisa de eliteO viés mercadológico, no entanto, restringiu o público àqueles com condições financeiras para ver, no estádio, o time por quem nutre devoção. O novo cenário partiu das mudanças nas praças esportivas. Agora, as arenas têm ditado as regras e o conceito imposto por elas ainda é uma incógnita, como pensa o especialista no tema Radamés Rogério, professor da Universidade Estadual do Piauí (Uespi) e doutorando em Sociologia da Universidade Federal do Ceará (UFC).

"Passamos por uma transição semelhante à que a Inglaterra viveu no apogeu do ´hooliganismo´. Assim como na época dos hooligans, os estádios brasileiros, em sua maioria, são frequentados por classes de renda mais baixas e muitos ligam a violência a esta parcela da população. A implantação das arenas tende à elitização, por conta do seu conceito mercadológico e do fim do ambiente hostil encontrado atualmente", pensa Rogério.

Na contramão desse posicionamento está o sociólogo Ricardo Gadelha, que não vê uma elitização hegemônica no País.

"No Brasil, há situações diferentes. Sim, em Brasília e no Rio de Janeiro, as arenas estão elitizando o futebol com ingressos a preços exorbitantes. Já no Ceará, o valor está congelado em R$ 30. Assim, a Arena Castelão não é um fator de restrição de público", avalia Gadelha.

E o futuro?
Ambos os especialistas concordam que vivemos uma mudança de modelo de gestão. Para eles, não há razão para demonizar as novas praças esportivas. O torcedor merece conforto e segurança nos estádios independente de conceito implantado. Recentemente, o ´padrão Fifa´ com ingressos a preços astronômicos ganhou um grande rival. O São Paulo resolveu baixar o valor do bilhete a R$ 2 e, ainda assim, dobrou sua arrecadação.

Para Radamés Rogério, isso é um exemplo que coloca em xeque o andamento do novo conceito e pode fazer com que clubes e consórcios quebrarem a cabeça em um futuro próximo.

"O valor do ingresso é algo a ser muito discutido. Os diretores de marketing não reduzem o valor dos bilhetes para não dar a impressão de desvalorização do produto. Mas têm de pesar se a baixa média de público ajuda na imagem do clube. O fato é que passamos por um processo de mudança de conceito e as dúvidas são naturais. Não creio que essa elitização chegue para ficar. Uma coisa é implantar, outra é nossa cultura se adaptar a esse padrão importado", ressalta.

Vivemos os primeiros atos de um novo cenário. Discursos simplistas relacionados às arenas não passam de mera teoria e exercício de futurologia. Rogério define esse momento em uma frase: "o futebol não está sem alma. Ele mudou de alma".

ILO SANTIAGO JR. / EDUARDO BUCHHOLZSUBEDITOR/ REPÓRTER


Castelão transformado
"Geraldino" sem lugar
Em partida entre Fortaleza e Ferroviário, em 1991, é possível ver a figura do "geraldino" que assistia ao jogo ali, de pertinho. Esse torcedor pagava mais barato pelo ingresso. Ele ficava nivelado ao campo de jogo. Algumas vezes, era alvo de objetos jogados das arquibancadas em direção ao gramado. Um dos lugares preferidos desse perfil de torcedor, praticamente extinto no futebol cearense, era o local reservado atrás dos gols, de onde era possível "cornetar" os defensores do time adversário. A última reforma e ampliação que transformou o estádio em arena eliminou o espaço outrora destinado para as camadas mais populares frequentadoras do Castelão. Nas fotos da década de 1990, é possível ver os detalhes da Geral, a distância para o fosso e a visão privilegiada da geral. Abaixo, como ficou o local onde antes permaneciam os torcedores, a maior parte pertencente às classes D e E. Hoje é espaço nobre, ocupado por quem paga mais caro Foto: Paulo rocha/ Máximo Moura/ Geórgia Santiago/ Waleska Santiago
Clubes perdem sem a ´Geral do Castelão´Sem conforto algum, visão limitada e o inconveniente de ser atingido na cabeça por algum objeto indesejável lançado das arquibancadas. Por que, apesar de todas essas desvantagens, a extinta geral do Castelão raramente não ficava cheia? Era barato. Bem mais em conta já para os padrões daquela época, onde o ingresso para uma partida de futebol era bem menos oneroso do que nos dias de hoje.

As pessoas das camadas mais populares tinham oportunidade de acompanhar seu time ali de perto, de onde dava para sentir a atmosfera do jogo. Era ali que estavam os torcedores mais identificados com os clubes. Desativado em 2002, mas abolido de vez na última reforma e ampliação do Gigante da Boa Vista para a Copa de 2014, o espaço destinado para os "geraldinos" virou arquibancada inferior.

Na opinião do autor do site especializado "Verminosos por Futebol", Rafael Luís Azevedo, a modificação trouxe modernidade e conforto, mas não necessariamente deveria ter extinguido a figura do geraldino. "Os clubes poderiam colocar preços populares, atrás dos gols, para atrair esse público. É preciso entender que se baixassem o preço e oferecessem várias opões de valores, não estariam perdendo dinheiro, e sim ganhando", diz.

Alternativa
Segundo ele, os bares absorveram esse público. "Mesmo sendo ilegal, por não haver fiscalização, cobram R$ 1,00 ou R$ 2,00 na periferia para ver o jogo pela televisão", avalia.

Para Rafael Luís, o Ceará, que atualmente manda seus jogos na Arena Castelão, está pecando em não abrir as cadeiras inferiores para a torcida. "O clube pode até achar que está economizando, mas está perdendo dinheiro. Se abrissem ali embaixo, daria a impressão para quem vê pela TV que o estádio estaria mais cheio. Do jeito que é feito, a impressão é que o Ceará não leva torcida para o estádio. Além disso, teria a pressão mais perto de campo contra os adversários. É uma economia de palito burra", aponta. 

Fonte:DN

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